O momento em que se fecha a capa dura da dissertação pode parecer o fim de uma maratona, mas, para a comunidade científica, é apenas o ponto de partida. A investigação que vive confinada às estantes das bibliotecas universitárias raramente cumpre o seu destino social: precisa de circular, ser lida, criticada, citada. Transformar uma dissertação num artigo científico é, por isso, um segundo ato obrigatório para qualquer investigador em início de carreira. Contudo, o processo não se reduz a cortar páginas até caber no limite imposto pelas revistas. Supõe re-imaginar o texto, reposicioná-lo perante um público diferente e navegar no labirinto editorial com estratégia.
À primeira vista, pode parecer paradoxal reduzir um documento de duzentas páginas a quinze. Mas basta lembrar que o propósito de uma dissertação diverge profundamente do de um artigo. A dissertação demonstra competência: prova que o autor domina a literatura, sabe defender escolhas metodológicas e é capaz de produzir um conhecimento original sob supervisão. O artigo, pelo contrário, deve comunicar a essência desse conhecimento a leitores ocupados – especialistas que exigem clareza e relevância imediata. É este desfasamento de propósitos que obriga à cirurgia textual.
O primeiro passo é identificar o coração argumentativo da pesquisa. Se a dissertação responde a várias perguntas ou explora sub-temas paralelos, o artigo não deve tentar englobá-los todos. Pergunte-se: que resultado acrescenta algo de novo à disciplina? Qual a mensagem que, se lida isoladamente, justificaria a publicação? A resposta a estas questões orienta a seleção de dados, figuras e referências que sobreviverão à poda. Tudo o que não servir diretamente essa narrativa (descrições extensas de contexto institucional, revisões exaustivas de teorias marginais, detalhes administrativos de recolha de dados) deve, sem dó, ficar pelo caminho.
Chega, então, o momento de reduzir o texto sem empobrecer o conteúdo. Na revisão de literatura, troque os longos parágrafos panorâmicos por uma linha argumentativa enxuta que conduza o leitor até à lacuna investigada. Em vez de citar vinte autores, escolha os seis estudos mais pertinentes e aponte, numa frase resumida, como é que o seu resultado converge ou diverge. No método, substitua descrições cronológicas por especificações essenciais: desenho, participantes, instrumentos, procedimento e estatísticas usadas. Os apêndices, que na dissertação acolhem questionários completos ou comandos de Stata, convertem-se, num artigo, em links suplementares alojados no repositório da revista ou em plataformas abertas como o OSF. O objetivo é manter a replicabilidade sem sacrificar o espaço de argumentação.
A secção de resultados merece uma linguagem económica. As tabelas de descritivos que ocuparam quatro páginas podem surgir condensadas em duas linhas de texto, desde que acompanhadas por um quadro de efeitos principais. Os gráficos são valiosos se traduzirem tendências complexas num relance, não desperdice figuras para mostrar algo que um número já evidencia. Na discussão, concentre-se nas implicações que dialogam diretamente com a literatura citada – nada de voltar a percorrer, ponto por ponto, cada capítulo do trabalho original. Os leitores de artigos apreciam o foco e a musculatura conceptual, não a fidelidade ao roteiro inicial.
Cumprida a metamorfose textual, inicia-se a etapa decisiva: escolher a revista certa. O entusiasmo leva, muitas vezes, a procurar publicações de topo sem ponderar o alinhamento temático ou o perfil da audiência. Uma boa estratégia começa por mapear revistas que, nos últimos três anos, tenham divulgado artigos sobre temas análogos. Leia os resumos, analise a finalidade declarada e repare nos métodos privilegiados. Se a sua investigação emprega uma análise qualitativa em profundidade, enviar para um periódico de estatística avançada é desperdiçar tempo. A afinidade metodológica e a temática pesa tanto como o fator de impacto.
Outro critério é a política editorial. Revistas de acesso aberto ampliam a visibilidade, mas podem cobrar taxas (APCs) consideráveis. Periódicos clássicos, sem custos para o autor, podem exigir exclusividade de direitos de autor. Estude também o índice de rejeição: um Journal com 80% de recusa representa prestígio, mas também um ciclo de revisão demorado. A carreira académica premia a persistência, mas o calendário de bolsas ou concursos pode exigir rapidez. Assim, equilibre a ambição e o pragmatismo.
Antes de submeter, adapte o manuscrito ao template da revista. Detalhes como a formatação das referências em APA ou Vancouver, a extensão do resumo, a localização das figuras e a anonimização para peer review não são meras formalidades: demonstram respeito pelo tempo dos editores. Um texto que chega pronto a entrar no processo reduz a probabilidade de desk-reject, o temível “rejeitado sem revisão” que encerra o jogo antes de começar. Além disso, seguir à risca as diretivas acelera a etapa de produção caso o artigo seja aceite.
Ao redigir a carta de submissão, fuja de fórmulas genéricas. Dirija-se ao editor-chefe pelo nome, explique em duas frases porque é que o seu estudo se adequa à linha editorial e destaque, com clareza, a contribuição mais original. Não exagere promessas nem adorne as frases: a honestidade concisa é a moeda de maior valor nas assessorias editoriais. Se a revista pedir a sugestão de revisores, indique nomes que não tenham conflitos de interesse e, idealmente, que pertençam a instituições distintas da sua.
Nenhum autor escapa ao veredicto dos pareceristas. Aceitações sem revisão são raríssimas – espere, no mínimo, um “aceite com modificações”. Quando receber os relatórios, respire fundo, leia duas vezes e converta as críticas em checklist. Para cada comentário, responda num documento à parte, citando a alteração exata no manuscrito ou justificando, com elegância, porque optou por manter a versão original. Evite o impulso de contestar em tom emocional – recorra a dados, citações e, se necessário, convidar o editor a mediar. Revisões rigorosas melhoram a qualidade do artigo e, por extensão, a reputação do autor.
Se o artigo for rejeitado, não encare como uma derrota final. Avalie se as críticas apontam falhas insanáveis ou se, com ajustes, o texto se encaixa noutra revista. Muitas vezes, basta encurtar o título, reposicionar a discussão ou adicionar uma análise suplementar para cumprir as expectativas de um novo público. A recusa é parte orgânica da trajetória científica, a resiliência editorial distingue quem publica de quem desiste.
Para estudantes de mestrado ou doutoramento, há ainda a opção de revistas que acolhem papers derivados de teses em secções específicas, valorizando justamente a perspetiva emergente dos novos investigadores. Embora possam ter um menor fator de impacto, oferecem um terreno fértil para a primeira experiência de submissão e permitem acumular citações iniciais que contam nos relatórios de produtividade académica.
Ao longo de todo o percurso, o orientador é um aliado estratégico. Consulte-o para avaliar o encaixe do manuscrito na revista-alvo, peça uma revisão crítica do argumento central e simule respostas a pareceres. Orientadores experientes conhecem os bastidores: sabem que alguns periódicos privilegiam abordagens teóricas, outros exigem uma robustez empírica e estatística minuciosa. Aproveitar esse conhecimento tácito encurta caminhos e evita armadilhas.
Não se esqueça de registrar a versão preprint, sempre que a política da revista permitir, em repositórios como o arXiv, SSRN ou SciELO Preprints. Os preprints aceleram a difusão e protegem a primazia da ideia, além de convidar a comunidade a comentar de forma construtiva antes da publicação formal. Em tempos de ciência aberta, a transparência acrescenta valor ao currículo e pode atrair colaborações.
Por fim, celebre cada marco: submissão, receção dos pareceres, aceite, publicação online, primeiro download. O ciclo de adaptação da dissertação a artigo não é uma mera burocracia, constitui um treino intenso de síntese, argumentação e diálogo crítico que, repetido ao longo da carreira, expandirá o alcance das suas descobertas. Do ponto de vista institucional, os artigos aumentam a visibilidade, atraem financiamento e consolidam redes de investigação. Do ponto de vista pessoal, transformam anos de trabalho num contributo palpável para o avanço do conhecimento.
Quando, meses depois, vir o título do seu artigo num índice de base de dados, recordará o ponto em que esteve a aparar capítulos inteiros sem saber se restaria algo de coerente. Descobrirá que a força de uma ideia não reside na extensão do texto, mas na nitidez com que se apresenta ao mundo. E perceberá que, ao aprender a escolher a revista certa, reduziu não o alcance da investigação, mas apenas o ruído que afastava os leitores do seu argumento fulcral. Isso, no fundo, é publicar: “fazer ouvir a ideia no exato tom de quem finalmente está pronto para dialogar”.
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